Transformação
Categorias
Tags
Minha vida está sendo reinventada através da arte. Sempre tive vontade de dançar, desde que me conheço por gente. Em contrapartida, nasci com uma má formação na coluna e pela ignorância das pessoas sempre ouvia dizer que pessoas com deficiência não poderiam dançar. Por um tempo até acreditei neste pensamento, mas nunca desisti deste meu sonho. Além de tudo, sou teimosa.
Quando comecei o 2º grau conheci uma profissional de educação física que me fez acreditar na minha capacidade. Comecei com ela através de atividades físicas e esta foi uma oportunidade que me colocou em contato com o meu próprio corpo, assim fui entendendo como ela poderia me ajudar e como eu poderia executar o que ela me propunha. Tive a experiência da natação e da musculação e, de tempo em tempo, fui me aventurando para outras modalidades. Experimentei-me no basquete, no atletismo, no surf, continuei com as duas outras atividades, mas nunca abandonei meu desejo de dançar e solicitava a profa. Renata para me orientar nesse sentido. Fazendo o depoimento de minha história em aula numa disciplina do curso de educação física conheci um profissional que aceitou me ensinar a dançar. Iniciei com o estilo contemporâneo por dois anos, depois conheci outros profissionais com quem ampliei meu aprendizado e três anos depois comecei a trabalhar profissionalmente na área da dança. Neste mesmo período fiz um curso de pós-graduação em neuro psicopedagogia com ênfase na educação inclusiva. Assim, comecei a descobrir meu potencial e sentir que minhas limitações físicas não eram empecilho e que eu poderia realizar meu sonho de dançar. Montei um espaço para ensaiar a dança e organizar meus projetos. Firmei parcerias com profissionais e disponibilizei o espaço para a realização de aulas e atividades sobre diferentes temáticas dentro da área da cultura e inclusão. Comecei a dar palestras e oficinas na área da inclusão e da dança adaptada, fiz aulas de diferentes estilos de dança como balé, flamenco, pole dance, teatro, música, danças populares, entre outros. Concluí a graduação em dança em 2016 e estou pensando em dar continuidade a meus estudos apresentando um projeto de pesquisa em nível de mestrado com foco na temática da dança para corpos diversos. Esse percurso tem me tornado uma pessoa menos “dura”, menos rígida no pensamento, menos agressiva nas palavras.
Eu entendi ao longo da vida que para me defender eu precisava ser forte e ao mesmo
tempo dar o troco como pudesse. Acabei me tornando uma pessoa ríspida, respondendo os preconceitos de forma rude, me fechando para os meus sentimentos. Muitas situações que ouvi ao longo da vida acabei transformando isso numa crença em minha vida. Sem analisar se o que me falaram era para mim ou não ou se era para me atingir por ciúmes e preconceito. Entendi que deveria ter uma armadura de ferro e reagir como uma máquina. Não me permitia sentir (medo, raiva, tristeza), só mostrar aquela fortaleza que todo mundo elogia e sempre mostrar felicidade.
Não que não seja uma pessoa feliz, mas como todo mundo as vezes bate uma “depre”. Também me fechei para expor através da comunicação o que sentia. Ficando diálogos pela metade, cada um com sua interpretação.
Com o passar do tempo na dança comecei a expressar meus pensamentos através do
corpo, mantendo por muito tempo muita resistência, algo que estou tentando mudar e evolui muito com essa movimentação.
Agora aceito conversar com algumas pessoas que confio ou com profissionais da psicologia sobre meus pensamentos, mesmo sendo loucos. Permito sentir vários sentimentos e expressar. As vezes se é um sentimento negativo faço isso sozinha, mas por muito tempo em minha vida nem sozinha eu permitia isso.
Estou tentando melhorar minha comunicação com todos. Expor o que penso sem ser
rude ou de forma mais tranquila. Conversando com quem concorda e com quem discorda de mim. Aceitando o jeito de ser e pensar dos outros. Em um processo de libertação. Não querer ser aceita por todos. Analisando se o que quero será bom para mim ou não e se penso que será positivo estou colocando em prática. Não estou esperando aprovação de todos como sempre fazia. Se com o passar de o tempo chegar à conclusão que o meu pensamento antigo não era a melhor opção, paciência, vou aprender com o tombo levado e crescer como pessoa. Aproveitar o processo e não só o resultado final. Algo que no passado era muito importante para mim. Ser mais leve comigo. Como a dança proporciona essa leveza para as pessoas e a mudança de rumo, intensidade, ritmo quando necessário. As vezes tenho recaídas, mas começo novamente e vou em frente.
O corpo desafiado pela arte não só comunica sensações, mas novas possibilidades de ser e estar, novas formas de perceber, conhecer e pensar o mundo e a si mesmo.
Roberta Spader
Posts relacionados
Mulheres na construção civil
Existe um ditado popular relativamente novo, que diz que “lugar de mulher é onde ela quiser”, e só uma coisa nós da equipe da Escola 365 podemos dizer...
Morar sozinha e seus perigos.
Vivemos um momento de empoderamento feminino, em que as mulheres estão tomando espaços seus por direito e com muita competência, assim com muita propr...
O eletricista e a memória curta | Relato
Eu particularmente não gosto quando as coisas não são resolvidas e ficam para depois sem um acordo exato de quando, como diz meu avô “o depois sempre...
Série: Olhos que condenam | Qualquer lugar
Criada, dirigida e escrita por Ava DuVernay, a série se baseia em fatos reais de um caso que ficou conhecido nos Estados Unidos da América, por ser um...
Mulheres dedicam mais tempo em atividades domésticas do que homens
Apesar do estudo apresentar dados importantes, essa realidade e visão de que as mulheres em sua grande maioria realizam a maior parte das atividades d...