Dança Fora do Padrão

Descobri que não adianta só ter experiência e querer dar aula, precisa ter a didática para tal. Aprendi na prática e junto com esse aprendizado que precisamos saber levar a cultura de cada comunidade.

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Desde 2014 comecei a ministrar aulas de dança no meu espaço e em projetos com editais municipais, estaduais e convite para interior de SP.

No início fiquei pensando muito o que passaria para os alunos, sempre queria passar os estilos mais conhecidos com a experiência que tenho e com a preocupação na qualidade. Tive muita resistência para colocar em prática o que tenho de conhecimento. Mesmo falando para todos que qualquer um pode dançar, ensinando que todos podem dançar livre. Na prática fazia diferente do que falava, querendo aprender de tudo.

Para começar sem erro, Uelinton e eu fizemos dois projetos juntos, um de montagem de espetáculo e outro de oficinas com a participação da Carla e Cristian nos mesmos moldes que já tinha participado até então. Pessoas com e sem deficiência, com e sem experiência em dança. Neste primeiro edital aprendendo o que era a escrita/execução de um projeto, pensando no objetivo que tinha participei como proponente e como cobaia dos oficineiros.

Divulgamos na mídia local, associações para PCD’s em Caxias e comunidade em geral. Junto com a prática fazíamos uma roda de conversa sobre vários assuntos. No primeiro encontro o bate-papo foi para um objetivo diferente do que pensamos. Aprendemos para o segundo, sempre pensando na condução e melhoria em cada encontro.

No ano seguinte participamos de mais um Financiarte e neste segundo já entrei como oficineira também. Apesar de não considerar, tinha certa bagagem no assunto e estava na graduação de dança.

Ao mesmo tempo me lancei nos projetos da prefeitura para comunidade. Pensando que as pessoas aceitariam muito fácil algo novo com o intuito de aprender o diferente. No primeiro momento escolhi os locais que executaria as aulas: escola João Pratavieira, associações de Caxias para deficientes. Alguns lugares fui prontamente acolhida e em outras teve a negativa. Ao mesmo tempo que fui convidada para ministrar aulas num espaço no bairro Campos de Cima da Serra e em locais esporádicos como APAE, Anjos Voluntários, Aldeia do Sesc, entre outros. Ficando feliz e surpresa.

Também descobri que não adianta só ter experiência e querer dar aula, precisa ter a didática para tal. Aprendi na prática e junto com esse aprendizado que precisamos saber levar a cultura de cada comunidade. No bairro Campos de Cima da Serra precisei conviver com pessoas com vulnerabilidade social e também a me impor. No início não foi fácil porque pensei que quem estava presente estaria porque tem interesse e ouviria minhas palavras. Nunca fui desrespeitada. Tive que ver adolescentes querendo mandar, gritar, assuntos sobre armas, drogas, mulheres, falta de comida, estrutura básica na família, num local que seria para acolher. Apesar de tudo sempre me ajudavam com minha estrutura de som, note, carro, cadeira de rodas, etc. Tive ajuda dos demais professores e assistente social.

Usei dança contemporânea, capoeira, etc e montamos um trabalho que iria para um evento de final de ano no bairro e acabou não acontecendo.

No Aldeia do Sesc apresentei e fiz oficina numa escola manhã e tarde para turmas de idades distintas. Tirando que foi necessário administrar a conversa paralela e pulso firme, no mais executaram tudo que eu passei. As vezes com o preconceito de que homem não dança, que a ideia que estava passando não era dança. Desconstruir ideias.

No João Pratavieira foi mais tranquilo até certo ponto porque os alunos se identificavam comigo por serem deficientes. No primeiro ano tive ajuda de todos os professores, mas também esbarrou na questão do que é ou não é dança. Junto que com a apresentação final não pude estar presente no dia marcado por outros motivos profissionais e por não ser o dia da minha carga horária na escola. Resolvi gravar as coreografias para ser passado no dia do evento. Vi que ensaio é ensaio, dia da apresentação é outra história. Nem todos fizeram como tínhamos planejado. Isso que tinham feito muito bonito no ensaio. Precisei participar da gravação com eles. A pessoa que estava filmando também teve problemas técnicos e entregou o vídeo atrasado para escola. Aprendizados da vida.

Também duas vezes por semana usava as dependências da UCS para aulas para os alunos da L’aqua e comunidade em geral. Aproveitando a boa convivência que tenho com os professores, gestores e alunos da Universidade. Mesmo assim a adesão não foi grande.

Comecei a pensar o que precisava melhorar para atingir o público que não frequentava minhas aulas e na minha pedagogia com a dança. Junto com o meu interesse em aprender outros estilos, pensei que poderia passar essa experiência para meus alunos. Como passar a técnica de outros estilos de dança para pessoas com e sem deficiência com um corpo deficiente? Precisei estudar e treinar muito mais que eu pensava, mas foi uma boa experiência.

Nesta primeira etapa pela prefeitura éramos autônomos tanto na escolha como no pagamento. Apresentávamos o MEI para prestação de contas, junto com chamada e ficha de inscrição. A remuneração era melhor.

No meu Espaço Ser junto as oficinas comecei a fazer parceria para que outras pessoas dessem aula regulares e não regulares (canto, dança, música, instrumentos musicais, mentes, teatro), ensaios. Eu não me sentia segura para ofertar um curso meu, particular, num lugar onde na teoria estaria mais segura. Fazia muitas aulas no Espaço Ser e outros espaços culturais, escolas, cidades, estados, países como aluna.

No ano seguinte a prefeitura contratou uma empresa terceirizada para fazer a contratação dos educadores sociais e este local definiu os locais que eu iria dar aula: uma escola no Mariani, Centro de Esportes e Cultura (Ceu) no Cidade Nova e continuei no João Pratavieira.

Foi mais um desafio. Na escola as oficinas eram ministradas no turno inverso ao de aula e nem sempre os alunos apareciam, no Ceu tive dois alunos fixos e outros esporádicos, na escola João Pratavieira esbarei na ideia de que as apresentações para os pais deveriam seguir o padrão que as professoras já executavam. Com os alunos não tinha problema em passar a minha ideia, mas para o restante da estrutura precisei seguir o que queriam. Além de conviver com a diversidades de ideias entre as professoras e que acabava sendo uma briga de ego. Sempre vejo pensamentos contrários como uma questão para refletir e unir o melhor de cada um, mas neste caso não foi isso que aconteceu.

Em 2019 tive duas oportunidades maravilhosas de bolsas de estudos e onde foi a virada de chave para confiar em mim. Fevereiro fiz a especialização de Danceaility com Alito Alessi em Montevideo por um mês para ser docente nesta metodologia e um mês em Nova York estudando inglês para negócios. Aproveitando tudo que este país podia proporcionar de cultura (Brodway, Museus, Times Square, etc). Descobrindo que através do esporte e da dança eu consegui minha independência.

Em 2015 fui para Portugal conhecer a companhia dançando com a diferença na Ilha da Madeira, mas tudo ficou mais claro quando fiz essas viagens a dois anos atrás. Comecei a dar aula no meu espaço, queria ensinar para todos o que venho adquirindo nestes 13 anos e como veio a pandemia aprendi um pouco de marketing digital. Estou trabalhando no presencial e no online, com lives falando sobre inclusão, cultura, dança, curso, imersão corpos diversos, projetos, editais de oficinas, montagem de espetáculos, entre outros sendo a proponente, criando o caminho para me lançar como uma trainee nacional e internacional onde mostro que o movimento é o pilar principal para o alcance da autonomia e realização pessoal.




Roberta Spader

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